Movimentos sindicais no Brasil
A classe operária no Brasil começa a se desenvolver no final do século
19, resultado das transformações econômicas, sociais e políticas da
época. O modelo agrário-exportador, baseado na produção de café, ganhou
nova força ao se deslocar do Vale do Paraíba para o Oeste Paulista,
criando as condições para a constituição do capital industrial e do
trabalho assalariado no Brasil.
A mão-de-obra escrava foi sendo substituída pela européia, atraída para
trabalhar nas fazendas e nas indústrias que se desenvolviam nas cidades.
Os primeiros núcleos operários surgiram principalmente no Rio de
Janeiro e em São Paulo, formados em sua maioria por imigrantes vindos da
Itália, Espanha e Portugal.
As condições de vida e de trabalho eram extremamente difíceis. Os
salários eram baixos e a jornadas de trabalho eram de 12 a 15 horas por
dia, sem direito ao descanso nos finais de semana e feriados. Sem
contratos de trabalho, as demissões aconteciam verbalmente e a qualquer
momento.
Os patrões não se responsabilizavam por doenças ou acidentes de
trabalho. Nas fábricas, os operários recebiam ameaças, castigos e
multas. Quando alguém ficava doente era socorrido por meio de listas. Os
aluguéis eram caros e vivia-se em cortiços sem água, luz e esgoto,
geralmente perto das fábricas.
As primeiras organizações e reivindicações
As associações mutualistas e de socorro mútuo tinham por finalidade
obras assistenciais e ajuda recíproca nos problemas de saúde, acidentes,
etc. Foram as primeiras formas de organização da classe operária, a
exemplo da Sociedade de Oficiais e Empregados da Marinha (1833),
Sociedade de Auxílio-Mútuo dos Empregados da Alfândega (1838), Sociedade
de Bem-Estar dos Cocheiros (1856) e Associação de Auxílio-Mútuo dos
Empregados da Tipografia Nacional (1873).
As ligas operárias começaram a ultrapassar os limites do
assistencialismo e do mutualismo. Reunindo quase sempre operários de
diversos ofícios e indústrias, tinham como objetivo a defesa dos
interesses imediatos e comuns de todas as categorias, como melhoria dos
salários, diminuição da jornada de trabalho, etc. Mais tarde apareceram
as sociedades de resistência, que eram núcleos mais homogêneos surgidos
das primitivas ligas.
Nos primeiros anos do século 20, as associações de resistência evoluíram
e deram origem aos sindicatos. As principais lutas dos sindicatos
tinham um caráter restrito e reivindicavam melhores condições de
trabalho: aumento salarial, jornada de oito horas, repouso semanal,
regulamentação do trabalho da mulher e do menor.
Nessa fase inicial da organização do movimento operário, que se estendeu
até o início dos anos 20, suas maiores lideranças eram de formação
anarquista e anarco-sindicalista. Ficaram conhecidos nomes como Everardo
Dias (1883-1968, operário gráfico e editor do jornal O Livre
Pensador); Oreste Ristori (jornal La Bataglia), Edgard Leuenroth
(jornal A Plebe), Neno Vasco (jornal O Amigo do Povo), entre outros.
Eles organizaram os sindicatos livres, as federações de trabalhadores e
a primeira Confederação Operária Brasileira (COB).
O I Congresso Operário Brasileiro e a fundação da Confederação Operária Brasileira
Insatisfeitos com a política dos patrões e do governo, os trabalhadores
avançaram em sua organização e realizaram entre 15 e 20 de abril de
1906, no Rio de Janeiro, o I Congresso Operário Brasileiro. Participaram
43 delegados, representando 28 sindicatos.
Com maioria de anarco-sindicalistas, o congresso votou a criação da
Confederação Operária Brasileira (COB), optando pela luta direta de
caráter econômico, contra a luta política levada pelos partidos, em
especial a eleitoral. O assistencialismo, o mutualismo e o
cooperativismo também foram negados.
Como métodos de ação, foram aprovados a greve (o principal instrumento),
sabotagem, boicote, manifestações públicas e outros. O congresso
definiu o 1º de Maio como dia de luta dos trabalhadores e a publicação
do jornal A Voz do Trabalhador.
Sobre estrutura de funcionamento, foi aprovada a substituição das
diretorias por comissões de administração; a relação dos sindicatos com
as federações como confederativa e não centralizada; não-remuneração dos
funcionários e diretores, salvo exceções.
Outras iniciativas foram: uma campanha pela jornada de oito horas;
posicionamentos contra o militarismo, as multas nas fábricas, pela
indenização por acidentes de trabalho, pelo pagamento em dia dos
salários, contra o alcoolismo, pela regulamentação do trabalho feminino e
proibição do infantil, contra os aumentos dos aluguéis, em defesa dos
colonos (contra os maus tratos dos fazendeiros), pelo direito de
organização dos sindicatos rurais, pela garantia do direito de reunião e
pela criação de escolas laicas para os sindicalizados.
O 1º de Maio após o congresso foi concorrido. Quinze dias depois, os
ferroviários entraram em greve. Em 1907 as atividades seguiram
aumentando. Entraram em greve os trabalhadores do Moinho Matarazzo.
Paralisaram as atividades os metalúrgicos, gráficos, tecelões,
costureiras, cigarreiros, encanadores, etc.
A greve alastrou-se por todo o estado de São Paulo e o governo reagiu
reprimindo o movimento. Em meio à mobilização e à repressão, a COB foi
fundada somente em 1908, unindo cerca de 50 entidades sindicais.
O Congresso Amarelo e a Lei Adolfo Gordo
Em resposta à crescente organização dos trabalhadores, o governo
realizou, por meio do deputado Mário Hermes da Fonseca (filho do então
presidente da República), um outro congresso operário para ganhar uma
parte dos dirigentes sindicais. Ele ocorreu em 1912, com 187 delegados e
cerca de 70 entidades, com passagens pagas pelo governo.
Suas principais deliberações foram a construção de casas operárias
financiadas pelo governo, a criação de auxílio e proteção, a
regulamentação do trabalho da mulher e do menor, a jornada de trabalho
de oito horas e o incentivo ao mutualismo e ao cooperativismo.
Aprovou-se também a criação de um partido operário e da Central dos
Trabalhadores Brasileiros (CTB).
Como parte dessa ofensiva, foi promulgada em janeiro de 1913 a Lei de
Expulsão dos Estrangeiros, conhecida como Lei Adolfo Gordo, que provocou
a expulsão de mais de uma centena de operários, na sua maioria líderes
sindicais.
O II Congresso Operário Brasileiro
O movimento operário não se intimidou. Na campanha contra a Lei Adolfo
Gordo, o jornal A Voz do Trabalhador voltou a ser publicado e o II
Congresso Operário Brasileiro foi convocado.
Realizado em 1913 no Rio de Janeiro, esse Congresso teve 100 delegados e
60 entidades, ainda com maioria de correntes anarquistas e
anarcosindicalistas.
Debateu-se o que seria o socialismo anarquista e a luta contra o assistencialismo.
O congresso reconheceu novamente a ação direta como método de luta e
discutiu questões de organização, o papel da imprensa operária e da ação
sindical. Foi aprovada uma campanha pelo salário mínimo nacional e
contra a participação do Brasil na Primeira Guerra Mundial.
A greve geral de 1917
A Primeira Guerra afetou profundamente a economia do país e a vida dos
trabalhadores. Começaram a faltar produtos industrializados vindos da
Europa e alimentos; a jornada e o ritmo de trabalho, para garantir a
exportação; os aluguéis subiam. O movimento operário começou a reagir.
No início de julho de 1917, cerca de 400 operários pararam a indústria
têxtil Cotonifício Rodolpho Crespi, em São Paulo. Logo outras fábricas
entraram em greve, como a Estamparia Ipiranga, Lanifício de Antonio
Camilis e a Antarctica. As paralisações chegaram às fábricas de
Itaquera, Cotia e Ribeirão Pires.
O governo reprimiu o movimento utilizando a polícia. Os feridos e
detidos eram centenas. O sapateiro Antônio Martinez morreu nos
conflitos, provocando uma reação imediata do movimento. Na manhã de 11
de julho, seu enterro se tornou uma simbólica manifestação. O cortejo
com mais de 10 mil pessoas partiu da rua Caetano Pinto, no Brás, se
estendendo por toda a rua Rangel Pestana, até a ladeira do Carmo, no
Centro.
Na volta, um assalto a uma carrocinha de pão iniciou uma onda de saques,
transformando a greve geral numa revolta popular. O comércio fechou
portas e os armazéns dos bairros foram atacados.
Entre os dias 12 e 15 de julho o número de grevistas reivindicando
aumento salarial e melhores condições de trabalho passou de 25 para 45
mil trabalhadores. Sob a direção do Comitê de Defesa Proletária (CDP),
fundado em 1915, a cidade de São Paulo ficou nas mãos dos grevistas por
dezenas de dias. Assembléias gerais com até 80 mil pessoas eram
realizadas na Praça da Sé, nos bairros da Móoca e da Lapa.
O governo não conseguiu vencer o movimento com a repressão. A greve só
chegou ao fim com uma negociação entre o CDP e uma comissão de
jornalistas representando o governo e os patrões. O governo prometeu um
aumento de 20% dos salários, nenhuma perseguição ou punição aos
grevistas, cumprimento da jornada de oito horas e proibição do trabalho
noturno para as mulheres e menores.
As promessas não foram cumpridas e os patrões demitiram os grevistas.
Mas a greve geral transformou-se num exemplo de luta para a classe
trabalhadora do país.
O fracasso da greve geral insurrecional de 1918
O 1º de Maio de 1918 foi diferente ao promover uma grande
confraternização e solidariedade com a Revolução Russa. No mesmo ano,
inspirados pela idéias anarco-sindicalistas, tentou-se organizar uma
nova greve geral. Os ativistas queriam eliminar, pela ação direta e
violenta, a exploração capitalista e criar uma sociedade igualitária.
O centro do plano era a cidade do Rio de Janeiro, mas a tentativa de
tomar o poder resultou em fracasso. Enormes manifestações ocorreram no
campo de São Cristóvão, na praça da República e em outros pontos da
cidade, com o objetivo de organizar a inssureição. No entanto, as forças
repressivas cercaram os protestos, prendendo dezenas.
Ficou evidente que, apesar do heroísmo, a classe operária dirigida pelos
anarquistas não estava suficientemente organizada. Não tinham um
partido centralizado nacionalmente como ocorrera na Rússia.
A superação do anarquismo e a fundação do PCB
Em congresso ocorrido nos dias 25, 26 e 27 de março de 1922, foi fundado
o Partido Comunista do Brasil (PCB). Diferente de outros países, seus
dirigentes não surgiram da social-democracia, mas do anarco-sindicalismo
e do anarquismo. Com exceção do alfaiate espanhol Manuel Cendón, que
tinha alguma noção do marxismo, os demais haviam militado no
anarco-sindicalismo: Astrogildo Pereira Duarte da Silva (jornalista),
Cristiano Cordeiro (advogado), Joaquim Barbosa (alfaiate), João da Costa
Pimenta (tipógrafo), Luís Alves Peres (varredor), Hermógenes da Silva
(eletricista e ferroviário), Abílio de Nequete (barbeiro) e José Elias
da Silva (construção civil).
A formação do PCB materializava as conclusões a que ex-dirigentes
anarquistas haviam chegado quanto aos limites do projeto libertário.
Entenderam a necessidade de uma organização, um partido do tipo
bolchevique, capaz de centralizar e reunir a ação política da classe
operária para destruir o Estado e conquistar o poder político, rompendo a
visão economicista e apolítica da ação direta.
Mas o recém-fundado PCB teve um período breve de atuação legal. Em julho
de 1922 o então presidente Artur Bernardes, em razão das reivindicações
operárias e da rebelião dos tenentes do Forte de Copacabana, decretou o
estado de sítio. A sede do PCB foi fechada e o partido passou à
ilegalidade.
Apesar disso, o PCB começou a lutar pela direção sindical e política da
classe operária. Defendendo sua unidade sindical e política, buscou
construir a Confederação Geral dos Trabalhadores (CGT) e um bloco
político, o Bloco Operário e Camponês (BOC). Paralelamente, a Juventude
Comunista foi criada em 1925. No mesmo ano é lançado o jornal A Classe
Operária.
A construção da CGT
Em 1923 ocorre a Conferência Sindical Regional do Rio de Janeiro,
convocada pela Federação dos Trabalhadores do Rio de Janeiro, dirigida
pelos anarquistas. Os comunistas presentes na conferência lutaram pela
unidade do movimento, defendendo que a federação abrigasse todos os
sindicatos, sem distinção de tendências. Os anarco-sindicalistas
defendiam a unidade com base nos princípios anarquistas. Ao ficarem em
minoria, se retiraram da conferência e fundaram a Federação Operária.
Em fins do mesmo ano, outra conferência aconteceu, promovida pela
Confederação Sindicalista-Cooperativista Brasileira, dirigida pelos
pelegos. A intervenção dos delegados comunistas ganhou a maioria. Com
isso, o presidente da CSCB pôs fim à conferência.
Em 1925, mais uma conferência é convocada pela Federação Operária do Rio
de Janeiro. Chocam-se novamente os pontos de vistas de comunistas e
anarquistas.
Enquanto os anarquistas defenderam a unidade orgânica com base nos
puros princípios anarquistas, os comunistas defenderam a unidade com
aqueles que não defendiam tais princípios. Os comunistas obtiveram a
maioria e foi constituído um comitê provisório de organização. No
entanto, seus trabalhos foram interrompidos pela repressão após o 1º de
Maio.
A idéia de construir a CGT surgiu em julho, contraditoriamente proposta
pela União dos Empregados do Comércio (UEC), de orientação pelega. Os
comunistas apoiaram a idéia e, em seu 2º Congresso realizado naquele
ano, aprovaram um plano para a construção da CGT. A idéia era constituir
grupos e comitês pró-CGT nos sindicatos, que se uniriam através de
federações em nível regional, estadual e nacionalmente, por meio do
Comitê Central Nacional provisório, encarregado de levar os trabalhos
até o congresso de fundação. Os anarco-sindicalistas e os próprios
sindicalistas amarelos (pelegos e reformistas) se uniram contra esse
plano, mas logo ele ganharia o apoio da maioria da classe operária.
Em 1929 é finalmente realizado o Congresso Sindical Nacional e é fundada
a Confederação Geral dos Trabalhadores do Brasil (CGTB). Essa política,
somada à tática do Bloco Operário e Camponês (BOC) - uma frente que
deveria reunir o conjunto das oposições - formado em 1928, levou o PCB a
ganhar a hegemonia na classe operária.
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